O pão do burro

Os miúdos juntam-se em grupo e lá vão eles ao caminho. Os mais novos têm uns dez anos, os mais velhos não têm muito mais. A partir de uma certa idade, o trabalho é mais certo do que o estudo e só vão à escola quando tem mesmo de ser. 

- Só era preciso saber escrever o nome e fazer contas – explicam. 

Vão a caminho da aldeia do lado porque a deles já não tem escola que os acolha e naqueles tempos não há pais que os levem ou que se certifiquem que eles chegaram bem e o conceito de autocarro escolar é algo desconhecido. Vão a pé, mas lá vão eles. Rapazes e raparigas que estão separados na escola, mas fazem o caminho lado a lado. Vão sozinhos, sem adulto que olhe por eles. 

- Os tempos eram outros – é o que se vai ouvir daí a uns anos. 

Se eram.

- E toda gente andava a pé, nunca estávamos sozinhos – continuam. 

Os rapazes feitos homens assumem o papel de guarda-costas das raparigas. As malas levam os livros de quem tem a sorte de os ter e um pão guardado para o lanche ou para quando a fome der sinal. 

Mais tarde, quando a escola fechar portas, fazem o caminho de volta sem que ninguém lhes controle a hora de chegada. Os rapazes, mais impacientes, aceleram o passo e não esperam pelas raparigas. 

- Elas paravam em todo o lado – é o que vão defender quando contarem esta história. 

E as raparigas fazem o caminho sozinhas que naquele tempo não existiam perigos como os de hoje. Os rapazes já vão tão longe que nem se ouvem. 

 O burro espera por elas no sítio do costume. As raparigas tiram o pão da mala, muito bem guardado dentro do saco de pano que a avó costurou, e servem o jantar ao burro antes de seguir viagem. 

Deus as livre de chegar a casa com um pão esquecido na mala. A comida é sagrada e é pecado não a aproveitar.

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