Fosse no meu tempo

Cesta à cabeça equilibrada numa sogra feita dos trapos que se encontravam lá por casa. Hoje, não havia quem o fizesse. Quem é que aguentava aquele peso em cima? E temos de ver que eram aqueles tempos em que os corpos nem pareciam ter como se manter de pé quanto mais aguentar uma cesta em equilíbrio. Não havia sustento que chegasse para encher aquele corpo que, quando chegava a quinta feira, só cheiravam a gaveta para enganar o estômago com o cheiro das migalhas do pão. 

Descalças rua acima e rua abaixo, nos campos secos em época de colheitas, na geada dos dias de Inverno. Pés que já nasceram calejados com a pele ressequida e a cortar nos calcanhares. As dores, quando as havia, eram esquecidas que os tempos não estavam para lamurias. Era aguentar e cara alegre.

Quem é que hoje andava assim? Aquilo era uma pobreza em que nem se sabia que se podia sonhar. Eram outros tempos, mas não era vida. Havia de ser hoje. Com os meninos que agora são deixados à porta da escola porque não os deixam entrar com o carro lá dentro mesmo. Era deixar e iam ver se não deixavam os cachopos à porta da sala. Iam lá agora andar descalços e de cesta pendurada à cabeça. 

"olha o pescoço do menino, não aguenta", ai senhores, soubessem vocês o que é que ele aguenta se assim tiver de ser. Acham que nos tempos da outra senhora, como vocês tanto gostam de dizer assim em ar de piada, as crianças tinham querer? Tinham era de obedecer e cara alegre.

Ai se isto fosse no meu tempo. Nem sabiam os meninos o que os esperava. 

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