Lugar à mesa da avó

As galinhas eram criadas no quintal da casa. Um galinheiro feito com meia dúzia de tábuas e mais umas redes. Não era preciso muito mais do que isso para guardar umas quantas galinhas. Eram alimentadas pela família que, sem ensino que os guiasse, tratavam delas com a sabedoria da terra. Davam de comer, tiravam os ovos e sabiam a altura certa para as matar.

Cortava-se o pescoço à galinha e tiravam-se as penas em água quente. Era assim que começava a refeição criada lá em casa.

A galinha, preparada com o rigor que se põe nestas coisas, ia ao lume numa panela de água com uma bocadinho de chouriço. Daquele vermelho e saboroso. Coisa pouca que o dinheiro não é muito e só se quer que dê sabor. Ia tudo a ferver em medidas feitas a olho. Aquela panela dava para alimentar a família e a partir daí era a mão que mandava no tempero.

O cheiro à carne cozida enchia o pequeno barracão mal iluminado que fazia as vezes de cozinha. O chouriço dava um tom avermelhado à água que começava a borbulhar.

Quando a galinha estava pronta era pôr num tabuleiro de ir ao forno. Quando o forno ainda era a lenha e demorava o seu tempo até chegar ao calor certo. Cozer o arroz no caldo que sobrava da cozedura e deixar o acompanhamento pronto em mais um tabuleiro. O chouriço era cortado em rodelas e espalhado por cima do arroz. O pitéu estava pronto. Arroz de forno e frango corado. 

A pele saía tostada do forno, o arroz vinha guloso com a gordura do chouriço a ferver. O cheiro era daqueles que confortava a alma. O reconhecimento de comida que é nossa.

Juntava-se a neta à mesa. Com as pernas a baloiçar na cadeira e o cabelo em desalinho de tanto correr. 

- O que é almoço? - perguntava com aquela voz de criança.

- Já vais ver - diziam sem desvendar mais nada.

E ela esperava. Com o cheiro já a dar-lhe água na boca.

Os tabuleiros vinham para a mesa a escaldar. Embrulhados em rodilhas que protegiam as mãos que os carregavam.

- Arroz da avó - gritava a neta com excitação. Era o seu prato, feito para ela.

E ficava para sempre baptizado como o arroz da avó. Mesmo quando era a mãe a prepará-lo em casa com o mesmo carinho. O arroz que a avó preparava com todo o rigor e sem receita. Passado de mão em mão e executado sem dúvida quando se cozia uma galinha e se levava ao forno a corar.

Frangainho quando dizem aos mais novos quando os tentam convencer a comer mais uma garfada do almoço. 

Frangainho do campo, corado em forno de lenha com arroz da avó a acompanhar.


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